Nu

O tempo passa. Passa correndo.

Por que insistimos em pensar, nós, criaturas pequenas, que temos todo o tempo a nosso dispor? O que fiz eu, menor das criaturas, do tempo que já passou?

Penso que não sei nada. O que faço de melhor é escrever e cantar. Mas note como são simplórios os meus textos. Note como, por mais bem amarrados que sejam, são faltos de conteúdo.

E cantar? No meu caso, é um dom. Meu canto – que está longe de grandioso – se aprimora sem que eu me esforce. É das Tuas mãos que me vem a habilidade.

Palavras “difíceis”... Melismas... Usá-los me torna bom? Claro que não. Bom é exatamente o que eu não sou.

Ainda assim, penso ser melhor que os outros. Como pode ser?

Olhar para aqueles que não têm as mesmas oportunidades que eu e menosprezá-los. Tanta oportunidade, e eu ainda não aprendi a humildade como eles. Tanto esclarecimento, e eu ainda sou mais cego do que todos eles. Por que me expor desta forma? Talvez esse seja um modo de desnudar o que há de pior em mim, humilhar o que nunca quis em mim, na tentativa de sufocá-lo até a morte. Talvez seja uma maneira de Te falar que eu não estou conformado comigo mesmo, na esperança de alcançar Tua graça. (Quem me dera ser-Te fiel como me é a Tua graça!)

Se eu me desse com Exatas, se fosse o maior dos gênios, numa possibilidade remota, certamente me dedicaria a construir uma máquina que me transportasse de volta no tempo.

Então, faria valer cada vez que me falaste, a primeira vez que me deste perdão, cada vez que o Teu poder fez-se tangível em minha vida e eu desperdicei.

Chegando outra vez o dia de hoje, ao invés deste texto, escreveria um texto que falasse de Ti e edificasse vidas. Falaria das grandes coisas que estarias fazendo em minha vida (e que agora não podes fazer, pois deixei correr pelos vãos dos meus dedos as chances que me deste).

Oh, Deus! Dá-me mais vinte e dois anos, ao menos. Ajuda-me a vivê-los plenamente: vinte e dois anos de vida que compensem meus vinte e dois de perda de tempo... Dá-me hoje, se possível, a nova vida que só Tu podes colocar a meu dispor.

Sabes bem o quero, Senhor. Conheces bem meu miserável coração.

Eu confio em Ti e em Teu poder. Rendo-me a Ti e a Teu poder. Por favor, salva-me...!

Sei que Teu favor imerecido está a meu dispor. Obrigado...